MEMÓRIAS DE CROCODILO
CAPÍTULO 15
Enchia-se o depósito do velho Vauxhall Velox com cem escudos, o que permitia ir a Vilarinho e vir, e, a fazer fé no meu tio, que a devia ter como vimos no episódio da Santa Rita, ainda dava até meio da semana. No entanto, nomear apenas a aldeia, sem lhe precisar um local no mapa, ficaremos sem saber se os ditos cem escudos eram quantia demasiado alta ou maquia insignificante para os quilómetros percorridos e daí até ficarmos às escuras relativamente ao preço da gasolina na década de cinquenta vai um passo de criança, como diria o Zé Mário. Mas, se ao leitor disser que Vilarinho era uma freguesia do concelho de Cacia, distrito de Aveiro, já poderá fazer as suas contas, por estimativa é certo, mas também as faz a EDP e é empresa pública, que só serão exactas se lhe disser que nessa viagem de domingo percorríamos perto de cento e cinquenta quilómetros. Durante o percurso, para preencher mais animadamente o tempo, eu, o Agostinho Terrão e o Nelo, o irmão, divertíamo-nos a jogar (a minha veia lúdica estava sempre presente) aos “marcos”.
De cabeça erguida e olhos espetados no desfazer das curvas, procurávamos ser os primeiros a descobrir os marcos quilométricos que se íam sucedendo na estrada, aos quais gritávamos –“É Meu !”. Os pequenos valiam um ponto, os maiores, os das dezenas, valiam dois. Recordo-me das discussões animadíssimas relativamente à propriedade de alguns deles, normalmente resolvidas pelo meu tio que, ao volante, arbitrava a contenda. De vez em quando, vendo-me mais distraído, acotovelava-me, dando-me sinal de algum marco já visível mas que eu ainda não enxergara. A eterna questão das arbitragens …
A estrada era a 109 que, saindo do Porto por Gaia através da Rua da Rasa, passava por Espinho, onde estava o quilómetro dezoito sempre muito disputado; Esmoriz (que me ficou na memória por, numa manhã de temporal, junto à bomba de gasolina que ainda lá está à face da estrada, me ter assustado com a água que corria em grande caudal pelas bermas); Avanca, Estarreja, Angeja, Salreu e, finalmente, Cacia. Já perto da aldeia, muitas vezes saltava para o colo do meu tio que me deixava guiar os últimos quilómetros.
Ao domingo íamos “à Terra”, afirmação de todo incorrecta mas que aqui reproduzo por ser essa a única que durante anos me habituei a ouvir e a repetir. Primeiro, se à Terra pretendíamos ir, não fazia sentido já que nela estávamos desde o nascimento, se era à outra terra, não me recordo de alguma vez ter regressado, eu ou qualquer dos meus, de mãos sujas ou de saco às costas. Íamos, portuguesmente à aldeia.
Enchia-se o depósito do velho Vauxhall Velox com cem escudos, o que permitia ir a Vilarinho e vir, e, a fazer fé no meu tio, que a devia ter como vimos no episódio da Santa Rita, ainda dava até meio da semana. No entanto, nomear apenas a aldeia, sem lhe precisar um local no mapa, ficaremos sem saber se os ditos cem escudos eram quantia demasiado alta ou maquia insignificante para os quilómetros percorridos e daí até ficarmos às escuras relativamente ao preço da gasolina na década de cinquenta vai um passo de criança, como diria o Zé Mário. Mas, se ao leitor disser que Vilarinho era uma freguesia do concelho de Cacia, distrito de Aveiro, já poderá fazer as suas contas, por estimativa é certo, mas também as faz a EDP e é empresa pública, que só serão exactas se lhe disser que nessa viagem de domingo percorríamos perto de cento e cinquenta quilómetros. Durante o percurso, para preencher mais animadamente o tempo, eu, o Agostinho Terrão e o Nelo, o irmão, divertíamo-nos a jogar (a minha veia lúdica estava sempre presente) aos “marcos”.
De cabeça erguida e olhos espetados no desfazer das curvas, procurávamos ser os primeiros a descobrir os marcos quilométricos que se íam sucedendo na estrada, aos quais gritávamos –“É Meu !”. Os pequenos valiam um ponto, os maiores, os das dezenas, valiam dois. Recordo-me das discussões animadíssimas relativamente à propriedade de alguns deles, normalmente resolvidas pelo meu tio que, ao volante, arbitrava a contenda. De vez em quando, vendo-me mais distraído, acotovelava-me, dando-me sinal de algum marco já visível mas que eu ainda não enxergara. A eterna questão das arbitragens …
A estrada era a 109 que, saindo do Porto por Gaia através da Rua da Rasa, passava por Espinho, onde estava o quilómetro dezoito sempre muito disputado; Esmoriz (que me ficou na memória por, numa manhã de temporal, junto à bomba de gasolina que ainda lá está à face da estrada, me ter assustado com a água que corria em grande caudal pelas bermas); Avanca, Estarreja, Angeja, Salreu e, finalmente, Cacia. Já perto da aldeia, muitas vezes saltava para o colo do meu tio que me deixava guiar os últimos quilómetros.
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PERGUNTA 15 : Qual era o rio que passava na aldeia ?
1 Comments:
At 8:51 da tarde, MJ said…
Doce Alquimista :-)
Como já uma vez te disse, tenho pena que as minhas memórias da infância não sejam tão "ricas" quanto as tuas.
Nem "terra" tinha para onde ir... A minha terra foi sempre esta. :-)
Mesmo durante as viagens de automóvel, o meu entretimento era muito "solitário". Passava o tempo a cantar, imitando cantoras famosas na época.:-)
Incrível! Hoje quase não tenho voz para cantar o "Parabéns a Você"!:-)
O rio? Elementar meu caro Alquimista António! O Vouga! :-)))
Beijo afónico*
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